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segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Revelação

O objetivo do terrorismo é promover o terror. Há três meses ele fez seu primeiro contato. Lembro de pensar tratar-se de alguma brincadeira. Recebi no celular o torpedo que dizia: “Eu conheço seu passado”. Não havia como responder, pois a mensagem fora enviada de um número restrito. Toquei minha vida dentro da normalidade. Beijei minha esposa e filha antes de ir trabalhar. Dias depois, recebi um e-mail ameaçador: “O silêncio custa caro.” O que poderia ser isto? Algum tipo de vírus?


Uma semana depois, foi a vez do Orkut me surpreender com um depoimento: “O que seus amigos vão achar quando eu revelar seu maior segredo?” O perfil do usuário sequer possuía uma foto ou qualquer outro elemento que o identificasse. Fiz mentalmente uma lista de prováveis pessoas que conhecesse bem minha vida e que estariam dispostas a me prejudicar. Suspeitei de algumas ex-namoradas, mas não acho que nenhuma delas seria tão engenhosa para armar esse tipo de vingança. Colegas do tempo de escola que peguei no pé? Talvez. Admito que já aprontei bastante na juventude, mas não me lembro de nada que fosse digno de ser usado como chantagem contra mim.

Alguns dias se passaram e o Facebook indicava uma nova mensagem: “Sua família seria capaz de suportar a verdade?”

Respondi a provocação exigindo que se identificasse e dissesse de uma vez por todas o que queria de mim. Só fui respondido no final daquela semana quando entrei no MSN e um tal “O Vigia” surgiu online. “Você não sabe quem sou" – dizia ele – "mas eu o conheço muito bem. Não espero nada de você, apenas desejo que todos saibam do que foi capaz.” Tentei fazer algum acordo. Ofereci o dinheiro que eu guardava no banco para comprar um barquinho, mas ele demonstrou desinteresse em qualquer propina. “Só o que me interessa é desmascará-lo. Não há nada que você possa me oferecer que me faça desistir de minha missão.” Dizendo isto, desconectou-se.

Contratei um detetive particular com experiência em crimes virtuais. Ele tentou rastrear a origem das mensagens, mas todas as suas investidas só nos levaram a um labirinto cada vez mais complexo e insolúvel.

As ameaças ainda se espalharam por todos os sites de relacionamento que eu fazia parte (alguns eu nem lembrava que possuía conta). Foi no Badoo que ele deixou seu último recado: “À meia-noite deste domingo abrirei a caixa de Pandora. Todos saberão o que tentou esconder por tantos anos. Aguarde.”

Ele estava obstinado. Lutei da maneira que me era possível, mas não havia nada que eu pudesse fazer. Minha esposa, minha filha, meus colegas de trabalho, todos perceberam que algo acontecia comigo. Tenso, já não conseguia dormir ou comer.

Finalmente, chegou o dia da revelação. Temendo a reação de todos, vim parar neste quarto de hotel de quinta categoria com meu laptop. São 23:52h. Em oito minutos ele divulgará em todas as redes sociais o fantasma que sequer desconfiava de sua existência e hoje me assombra.

...

23:55h.

Não há nada que eu possa fazer agora, senão esperar.

Ou será que há?

Num rompante, vasculhei meus contatos na agenda do meu celular. A primeira ligação que fiz foi para minha esposa que, preocupada, quis saber onde eu estava. “Apenas me ouça, amor. Meu tempo é muito curto. Eu te traí com sua melhor amiga e com sua irmã. Sinto muito, mas preciso desligar!” Em seguida liguei para minha mãe: “Lembra do nosso cachorro, o Paschoal? Eu disse que ele caiu da laje, mas fui eu quem o empurrou! Papai está em casa? Deixa eu falar com ele! Pai? Sabe o dinheiro que sumiu do seu cofre? Fui eu! E gastei com bebidas e prostitutas!”. O próximo seria meu patrão: “Chefe? Desculpe te acordar, mas preciso te dizer que todo dia cuspo em seu café e tenho maior tesão na sua mulher. Boa noite!”


Não daria tempo de ligar para todos. Tentei lembrar de tudo que mantive em segredo por anos e encaminhei como mensagem para todos os meus contatos na Internet. Confessei minhas mais íntimas experiências citando o nome de todos os envolvidos. Já que serei desmascarado, farei isso eu mesmo. Não deixarei nenhum segredo para ser revelado por este maldito terrorista ou por qualquer outro. Sou um livro aberto agora. Sei que sofrerei as conseqüências de tudo que disse esta noite, mas que seja assim. Que o véu seja retirado com minhas próprias mãos.

Meia-noite.


O laptop permanece conectado com a página do site que mais freqüento. No topo da página, um aviso diz que há uma nova atualização. Com a mão trêmula, pressiono a tecla F5. A página demora poucos segundos para atualizar, o que me pareceu horas. Enfim, a página reabre. O terrorista publicou uma foto minha quando eu era adolescente fazendo biquinho e um coração estilizado com as mãos. Em baixo, lia-se a seguinte mensagem: “Este usuário já teve perfil no Flogão.”

3 comentários:

Glaucia disse...

Coisa boa ver o meu escritor predileto voltando com tudo!!
Adorei o post! Bjs

Alê disse...

kkkkkkkk, coitado dele, estou com pena até agora, mais que homem mais burro, era preferível ter ficado calado e dito que era mentira, se fosse foto dizia que era montagem, mais o desespero nos deixa assim sem saber o que fazer, eu que o diga kkkk

Luck santiago disse...

Quem tem teto de vidro fica assim, rs ...