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terça-feira, 3 de julho de 2012

Única


Não gosto de mulher. Pronto, disse! Precisava pôr isso pra fora, já estava me fazendo mal.
Não estou dizendo com isso que gosto de homens ou que sou celibatário. Entendam que não tem nada a ver com orientação sexual, mesmo porquê orientar quer dizer levar ou ser levado a uma determinada direção. Sexo não nos guia em direção nenhuma. Sexo quer chegar, seja lá onde for. Sexo não conduz, é conduzido. Sexo não escolhe caminho, sexo se deixa atrair. Sexo se move a partir de um magnetismo que pode ser despertado tanto pelos atrativos mais óbvios como os mais incomuns. Afirmar uma direção exata como “eu gosto de mulher” é ser muito genérico. Quem assume sua preferência levando em conta tão somente o sexo como requisito está disposto a se relacionar com qualquer mulher, ainda que se comporte ou tenha a aparência de um homem, desde que a certidão de nascimento conste como feminino.
Ah, não é isso? Ser mulher tem a ver com aparência e comportamento? Então quem gosta de mulher também está disposto a se relacionar afetivamente com transgêneros, haja vista muitos transexuais serem dotados de uma feminilidade refinada e tão acentuada que deixam muita mulher no chinelo. Tudo bem que estes “dotes” podem causar um desconforto anatômico (principalmente se esse dote for maior que o nosso). Há intervenções cirúrgicas que eliminam essa questão, mas isso é suficiente para declarar-se mulher e nos deixar menos encucados?
Algumas pessoas agregam características às suas preferências: “Eu gosto é de mulher com peitão!”, ou “Mulher pra mim tem que ter bundão!”. Gorda, baixa, magra, alta, preta, amarela... Claro que há atributos que são levados em conta na hora de provocar nosso desejo, mas isto tudo nos limita. Por andar muito de bicicleta, sempre chamei a atenção por conta de minhas pernas, mas eu me sentiria péssimo se uma mulher me desejasse tão somente por esta razão. Eu até poderia fazer disso minha arma de sedução, mas sempre haverá algum maratonista ou jogador de futebol que representariam uma ameaça: “Desculpe, mas temos que terminar. Encontrei um cara que tem coxas mais torneadas que você.”
Às vezes, deixamos passar uma pessoa incrível em nossas vidas só porque ela não tem o formato da orelha que sempre sonhamos. Algumas vezes, cobramos de nós mesmos essas superficialidades. Achamos que nunca encontraremos alguém que nos ame enquanto não perdermos quinze quilos, comprarmos um carro do ano ou aprendermos a coreografia da música da moda. Se alguém se declara apaixonado por nós, chegamos a desacreditá-lo e a repudiá-lo, afinal, como alguém poderia gostar de alguém tão cheio de defeitos?
Antes de responder do que gostamos no outro, é preciso descobrir o que gostamos em nós. O que pretendemos manter conosco. A partir daí, nos policiaremos para que a pessoa que entre em nossa vida venha para acrescentar e promover a manutenção daquilo que nos faz bem, inclusive propondo as devidas transformações quando convenientes.
O que me conquista em alguém é a identificação e o que me instiga são os contrastes.
Definitivamente, não gosto de mulher. Mulher tem um monte por aí de tudo quanto é tipo. Eu gosto é da minha mulher e, esta sim, é única, pois, antes de ser minha, ela sabe ser dela mesma.

Um comentário:

Glaucia disse...

Amor,
Mais um texto ousado, provocador, como só você sabe ser!
Me encantas com o seu olhar! Amei a declaração, meu homem!