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sexta-feira, 18 de março de 2011

Como Montar uma Banda de Rock - Manual de Sobrevivência

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“Junte sete selos do seu jornal de bairro mais cinco reais e noventa e nove centavos e troque nos postos autorizados por um músico e seu respectivo instrumento! Complete sua coleção e arrase nos shows!!”

Bom seria se fosse algo simples assim. Como todo trabalho em equipe, montar uma banda requer talento para lidar com fatores humanos. Trabalhar com pessoas é sempre um desafio, ainda mais quando nos referimos a um projeto onde cada membro é um artista com suas peculiares interpretações sobre o universo musical.
Na minha opinião, há duas regras a serem observadas para que a proposta funcione: o vocalista canta para o público e os músicos tocam para o vocalista. Se isso estiver bem claro em sua cabeça, sua banda tem boas chances de dar certo, desde que você encontre outras pessoas igualmente adeptas desse pensamento.
Minha experiência no mundo da música me rendeu uma certa bagagem, de modo que me sinto na obrigação de alertar os desbravadores que almejam aventurar-se por essas veredas. Eis os arquétipos que vocês certamente enfrentarão em sua jornada:

Vocalista: Cartão de visita da banda. Todos o encaram como líder e ele faz questão de acreditar nisso. Acha que ninguém na banda leva o trabalho a sério, a não ser ele. Adora ter seu ego massageado e não admite ser menos que o centro das atenções. Sempre armado com discursos ensaiados como se fosse ser abordado a qualquer momento para uma entrevista. Tem o hábito de ensaiar poses na frente do espelho usando o controle remoto como microfone. Colecionador de roupas esquisitas. Se ele também é o letrista, se intitula o poeta incompreendido. Se ele toca algum instrumento (principalmente violão e/ou teclado) é só questão de tempo para ele jogar tudo pro alto para arriscar-se em uma carreira solo.

Guitarrista solo: O egocêntrico. Dedica-se a arrancar de seu instrumento o maior número possível de riffs, escalas pentatônicas, métodos gregos, dedilhados e outras firulas. Vive uma guerra não declarada com o vocalista disputando a atenção de todos. Colecionador de tablaturas e revistas especializadas em equipamentos. Possui uma pedaleira de cinco mil efeitos editáveis (mas só utiliza delay, distorção e phaser). Gasta mais com cordas, palhetas, cabos e outras tralhas para a guitarra que com a própria namorada. Se considera um símbolo máximo de virtuosidade. Possui uma conveniente deficiência auditiva, de modo que faz questão de tocar no volume máximo alegando que não está conseguindo ouvir direito seu instrumento. Sempre muito seguro de si, tem plena convicção que a banda não seria nada se não fosse por ele.

Guitarrista base: O despretensioso. Ganhou um violão de presente da madrinha e se reunia com a turma depois da aula para tocar canções da Legião Urbana e Engenheiros do Hawaí. Nunca pensou em tocar numa banda de modo que vive no limbo entre o acústico e o elétrico. Colecionador de revistas de cifras. Resolveu tocar guitarra por insistência dos amigos. Usa um pedal chorus que veio junto com a guitarra quando comprou de um músico de igreja evangélica. Estará presente em todos os ensaios, mas na verdade preferia estar em casa vendo televisão. Às vezes aumenta o volume de seu instrumento, o que provoca a ira do guitarrista solo. Outras vezes arrisca uma segunda voz (backing), o que acaba provocando as críticas do vocalista. Sempre tem um plano B, caso a banda não dê certo, por isso está sempre se envolvendo em outras coisas para nunca ser bom em nenhuma delas.

Baixista: Uma vez me disseram que “todo baixista é autista”... E são mesmo. Introspectivo, o baixista vive em um mundo só dele. Costuma rir sozinho durante o ensaio. Coleciona amigos imaginários. Se pudesse escolher um poder escolheria o da invisibilidade. Quase sempre passa despercebido no show, a não ser por alguns expectadores mais atentos que estranham “aquele cara tocando aquela guitarra engraçada”. Não tem opinião própria ou se tem não faz a menor questão de expressar.  De certo, é de fácil convívio, mas não espere nenhuma iniciativa. Sua atitude começa e termina em acompanhar as notas musicais fazendo marcação com a bateria. Seu lema é “Não sou contra nem a favor... Muito pelo contrário.”

Baterista: Sempre o primeiro a chegar nos ensaios, pois costumam acontecer em sua casa já que a bateria é um instrumento de difícil locomoção. Tem o hábito de acelerar a execução da música gradativamente enquanto a toca, fazendo com que uma balada romântica se converta em um hard core vigoroso. Se sente injustiçado por ter que se responsabilizar pelo andamento da música e ter que ficar escondido no fundo do palco atrás de suas parafernálias e dos outros músicos. Coleciona vídeo-aulas. Bota pra fora seus fantasmas pessoais através de suas baquetas, faz da música sua válvula de escape. Se quiser dar a ele uma notícia ruim, certifique-se de que há algo inanimado que ele possa espancar. Se compromete com a banda e demonstrará isso tocando, não espere ou exija mais que isso.

Tecladista: Esse sujeito ficava trancado no quarto estudando música desde criança. Alguém descobriu que ele toca e o convidou para entrar na banda. Agora ele tem amigos e incorpora com toda força a idéia de banda como família. Adora ensaiar, mas se sente frustrado, pois tudo que aprendeu sobre piano clássico e música erudita será abstraído e o limitarão a acompanhar a música com estribilhos simplistas e sustentações ultrapassadas. Um dia ele se sentirá sufocado por isso, mas não falará nada para não ofender os amigos. Nesse dia, ou ele tocará como Beethovem ou executará todos com uma metralhadora como Scarface.

Percussionista: Se acha uma espécie de Hermeto Paschoal. Um gênio da sonoridade que arranca melodia de qualquer objeto que emita som. Difícil embarcar em seus devaneios e está sempre experimentando novos ruídos que passarão despercebidos no show. Por falar em despercebido, por quê estou escrevendo sobre percussionista? Ele nem é da banda! Foi convidado para fazer uma pequena participação e agora vai a todo ensaio entulhando o estúdio com um monte de sucata.

Se você é capaz de conviver com personalidades fortes e excêntricas como essas (não esperem nada muito diferente), o desafio está apenas começando. Se sua banda for boa e se tiverem sorte receberão convites para tocar em vários eventos onde não receberão nenhum centavo (sorte porque em muitos casos vocês terão que pagar para tocar). Seu repertório será de noventa por cento de música cover e sempre compararão seu trabalho autoral com outras bandas conhecidas (algumas que você detesta).

No começo tudo pode ser muito divertido, mas, se não houver retorno, banda pode se tornar uma brincadeira muito cara e desgastante. A cada dia me convenço mais que talento e vocação não são fundamentais para alçar voo na carreira artística, portanto, não desanime. O caminho é esse mesmo. Não somos nós que escolhemos a música, é ela quem nos escolhe. O sucesso não é a regra, é a exceção.

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3 comentários:

Priscila Zarth disse...

Nossa, meu amigo, eu sabia que você tocava mas não sabia que entendia tanto dobre o assunto.Parabéns pela forma que você expresso seu conhecimento. Parabéns pela sua generosidade e pelo belo texto!

Gomez disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Gomez disse...

kkkk... é Cliver... verdadeiramente conhecemos bem o caminho da música... rs
é exatamente isso msm...
mas vc ñ comentou alguns tópicos importantíssimos que tornam a convivencia com a banda ainda mais dificil... rs
tipo...

1° Se o gutarrista base também for o vocalista, isso implica em um ego híbrido que se torna mais dificil ainda de entender... rs

2° Se o gutarrista base for o vocalista e também o letrista... sem comentários... rs

3° Se o gutarrista base for o vocalista, letrista e ainda se achar capaz de fazer o solo de algumas canções da banda...

ou seja, temos uma banda de um homem só, que é o caso do engenheiros do hawai, que por sinal eu adoro, mas acho que foi uma das bandas que mais mudaram de formação, por esses motivos, e ainda mais, o Humberto ainda toca teclado e tbm ja foi baixista da banda... que é um caso de "esquizofrenia de multiplas personalidades" kkkk
se eu fosse comentar td o q ja passei com bandas nesse blog...

Um forte abrço meu amigo!!!!

PS.: isso é fato de que todo baixista é autista.
mas nem todos ficam na sombra do palco, é só ouvir red hot, primus, infectous grooves e outras pra mudar a ótica... rs